sábado, 5 de novembro de 2011

Fugaz

Me lembro do dia em que parti e parti sabendo que voltaria, que era uma ida banal mas necessária, uma intervenção cirúrgica e eu regressaria, mas ainda assim, eu me lembro do dia em que parti.
Eu lia um livro daqueles que marcam, que marcam muito. Me sentei do lado esquerdo, na poltrona da esquerda, de modo a olhar a janela. Eu sempre amei as estradas, todas, sempre as amei. Amei e amo as estradas porque nelas sinto materializadas todas as minhas necessidades de fuga, naquele momento eu fugia da dor do ano, do momento, da minha vida, da solidão e também do motivo que me levava à uma cirurgia, mas isso era o de menos, eu amava as estradas.
Mais do que amar as estradas, eu amo as estradas à noite e amo a fuga. Me lembro que do meu lado se colocou uma senhora, não me deu trabalho, eu lia meu livro, observava a paisagem e amava a noite que arrumava no céu todos os astros e me mostrava, assim como ora escondia a luminosidade. Eu olhava ainda as pessoas, outra coisa que amo, olhar as pessoas.
Eu olhava as pessoas porque nas estradas escuras eu fugia e fugia sabendo que estava fugindo, as olhava sabendo que elas também fugiam, e que fugiam sabendo que estávamos todos fugindo pro mesmo lugar. Que fuga inútil!
Eu levava na mala as roupas, ora eu fugir sem minhas roupas, jamais. Levava também três ou quatro livros, eu queria fugir mas não queria ficar sozinho, eu e os livros e tudo o que eles me diziam, eu fugia por estradas escuras para os que me viam fugindo, mas eu fugia mesmo era pela escuridão da minha imaginação. Sim, nem mensurável era pra quantas cenas imaginadas fugi por cada linha engolida de cada um dos livros que levei, mas fugia e fugia duplamente, sabendo que de ambas as fugas eu iria voltar.
Levei um computador, a vida é dual  eu compreendia, compreendia que fugia pra um lugar onde todo mundo sabia que eu estaria, ora, mas eu não fugia? O computador era para falar com as pessoas de quem eu fugiria se de fato aquilo fosse uma fuga, mas as estradas fugiam.
E fugiam sabendo que a escuridão também fugia e que a cada hora clareava mais, porque eram fugitivas de mim e eu da claridade, as estradas dos pneus e eu da realidade.
Eu só me lembro que fugi indo e que depois fugi voltando, que fugir indo foi melhor do que vindo, sei que o horizonte fugiu mas que eu também fugi do céu e dos astros e das estradas e também da escuridão. Quando fugi era escuro e clareou, quando voltei da fuga era claro e escureceu, eu só me lembro da lembrança que não me foge a mente e da sensação que não me foge ao coração, porque eles não fogem de mim e não fogem sabendo que estão ficando, sabendo que não estão fugindo como eu fugi, duplamente.

domingo, 10 de julho de 2011

Uma Reflexão Acerca do Sentido das Coisas.

Tratadas questões essenciais e como já dito, "sempre prestes" como a Liberdade, o Amor, a Felicidade e as coisas duais como o Desejo, as Vontades, a Vida e as Virtudes é necessário saber para onde a conjunção de todos esses elementos há de nos levar por consequência ou pelo próprio caminho da construção de suas imagens. À isso vamos dar, neste momento, o nome de "Sentido das Coisas".
 Pensar no "sentido das coisas" nos exige fazer duas perguntas que vão abrir as portas e mostrar os caminhos pelos quis nós podemos desvendar os segredos contidos nessa expressão:
O que é o sentido das coisas?
Quando podemos percebe-lo, senti-lo e identifica-lo?
É prudente que pensemos o que é o sentido das coisas. Há muito tempo tratei, dadas as minhas reflexões que procuravam e ainda procuram desesperadas respostas às coisas urgentes da vida, da criação e da existência das coisas e por conseguinte das idéias e suas delimitações nos dando referencial de final e de começo de tudo o que há, do que existe.
Porém, para tratar do sentido das coisas é preciso abandonar a noção de começo e fim e assim, desafia-las.
Se o sentido das coisas tivesse uma noção geométrica e linear, em que a gente pensasse em uma linha onde a orientação do caminho a seguir indicasse esse sentido, então tudo estaria resolvido pois as determinações elminam as implicações do refletir, portanto o caminho da reflexão é o questionamento, para que as coisas não percam a razão de ser, o seu motivo, a sua essencialidade.
Subjetivamente, pensar em sentido das coisas nos pede um passeio pelo império daquilo que temos de mais aguçado, o nosso campo sensorial, das lembranças, da noção de passado, presente e futuro e isso se relaciona com o "quanto" já vivemos e em "quantas" situações distintas já nos encontramos.
Transpor esse pensamento do sentido das coisas para essa lógica subjetiva nos mostra exatamente o seguinte:
Quando estivemos no passado, que um dia foi presente, pensamos que o sentido da vida e das coisas era "um", quando aquele presente virou passado e futuro virou presente, vimos outro sentido e agora que aquele presente é passado e estamos agora mesmo consumindo o futuro, vemos outro.
O que se pode concluir do sentido das coisas? Mutável, instável e imprevisível, porém, indispensável.
Cada ano de vida e cada experiência nos reposiciona no papel de observador e muda a perspectiva de observação que fazemos das coisas e da vida, por isso é que quase sempre esbarramos na necessidade de "abandonar o velho" para iniciar algo novo, porque o velho a que nos referimos é um sentido para o qual não há mais caminho, para o qual nem a noção linear, nem a noção subjetiva nos serve mais, para o qual a única saída é criar um novo sentido, delimitar uma nova rota, trilhar um novo caminho.
É exatamente aí que podemos responder a segunda questão: Ora, se tudo isso, se esse reposicionamento do nosso papel de observador depende do "quanto" e em "quantas" a gente viveu, é possível simplificar e dizer que a cada nova idade nós vemos um sentido e vamos reposicionando a direção das nossas vidas. De fato.
É por esse motivo que pegamos fotografias antigas e percebemos que quando daquele registro, ´pensávamos em algo que hoje está afastado, que passou e ficou muito longe, com pretensões, sonhos e projetos. Inclusive se o sentido que haviana época,  foi hoje atingido, a obrigatoriedade do "seguir" nos pede mais sentido para continuar.
Assim, vale um convite para que, munido de um repertório musical que trate sobre "o sentido das coisas", todos nós continuemos a refletir sobre qual era o sentido no passado, qual o do presente e qual será o do futuro, aliás, as coisas andam tendo sentido na sua vida?

Agora esquece essa intenção que a vida acende o candelabro da razão...

Eu quero andar por onde
Ainda se ver somente o sentido
Puro sentido...


Trechos: Cacos - Vander Lee / Levo a Minha Vida Assim - Monique Kessous

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Uma reflexão acerca da Liberdade.

Talvez porque eu não tenha refletido que algo que não se sustenta em períodos de "repouso", não pode se não ter sido mal fundado em algum momento de sua dada construção, por força da circunstância ou por certa impossibilidade de mais forte se fazer ou ser tão pura e simplesmente. Há que se pensar nisso.
Talvez ainda a idéia de construção dê às coisas ou aos objetos consagrados pelo desejo e pela vontade, virtudes alimentadas pelo sonho humano, uma certa estaticidade às conquistas já findas e que nos restam preservar, que assim nos abale o perigo de que a brisa primeira as destruam, as levem,e nos provem que na arte de construtor, devamos em algum ponto ter falhado.
Algumas imagens um pouco estranhas são marcas do que o desejo e o sonho tem de tão dual, como por exemplo, a imagem de liberdade.
A liberdade! O que sérá a liberdade? Certa vez vi em um filme, um curta chamado Ilha das Flores, e talvez seja o que já ouvi de mais marcante sobre esse estado de ser livre que a gente tem e luta e busca e sempre sente que ainda falta e aí está:
 
"Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda."
 
Numa reflexão mais profunda a construção da liberdade é um processo doloroso e em alguns casos ilusório, sobretudo porque é relativo o lastro desse conceito para cada um. As imagens que tenho de liberdade, são em geral imagens de algo batalhado, sofrido, são imagens duais de conquista de um estado de liberdade ao mesmo tempo em que essas imagens me soam estranhas e doloridas, doloridas permanentemente, como uma condenação de liberdade, como uma prisão no estado de ser livre. Daí a dualidade da imagem.
Por outro lado, assim como falou Paulo Freire em sua obra, concordo que a liberdade é uma busca, um desejo daqueles que se entendem como ser inconcluso, na condição de humano interminado buscando se humanizar, daí que a liberdade me parece ser assim, tão tangencial, tão passageira, às vezes até volátil e capaz de evaporar.
Pra falar a liberdade assim, instável, atemporal e eterna ao mesmo tempo, Caio Fernando Abreu me empresta um trecho do conto chamado "Pela Noite", onde ele diz:
 "Porque é assim que é. Naturalmente. As coisas sempre prestes a serem apanhadas. E você eternamente prestes a apanhá-las. Como uma sina. Sempre prestes."
Nesse processo de construção, em alguns momentos acreditei, e ainda acredito, que negar algumas "algemas" de tudo o que "está aí" foram importantes na composição dessas idéias, ainda que eu não discuta o mérito de cada uma, mas neguei algumas crenças e até instituções.
Neguei e nego a existência de Deus, a credibilidade da instituição família e a crença nesses valores que ferem a coisa que mais me incomoda sentir falta: A liberdade.
Óbviamente que compreendido enquanto ser inconcluso, talvez eu viva "Sempre prestes" e não a alcançe, mas aí relativizo o conceito e chamo pra mim essa coisa que é quase como ter o "direito" à liberdade de sonhar, de compor idéias e de lutar por aquilo que no plano real/material/palpável representa a sedentação da sede da liberdade intrínseca do homem inconcluso que mesmo buscando algo que não há de achar como água em fonte, quer dela se saciar ainda que por representações distorcidas de uma realidade que é legítima por ser antes a dele, decisória, escolhida e permitida em virtudes e falhas, erros e acertos. Porque como disse Caio também e assim o penso:
"Não tenho nada contra qualquer coisa que soe a: uma tentativa."
Pois de fato, o que a gente não pode deixar de ter é o sonho, o desejo e a coragem de ser livre.


 


 
 

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Uma reflexão acerca dos nossos sonhos, da vida e das experiências.

Alguns dos meus sonhos não eram os sonhos de alguns que, como eu, tinham a mesma idade e viviam um mesmo momento. Nem maiores, nem menores, nem mais caros ou baratos, nem melhores nem piores, eram apenas sonhos.
Todos alí tinham uma certeza: a vida passava a chave na última tranca dessa porta que ficou por anos aberta e seria preciso abrir outra, ou então, trilhar aquele caminho que vivia aberto mas que lhes fazia abrir mão de algumas outras coisas. Eu como sempre, escolhi o mais difícil: vamos abrir a próxima porta.
Depois que você abre essa porta, você descobre que essa não era a tarefa mais difícil, portas são apenas portas, caminhos é que não são sempre caminhos.
Como trilha-los?
Acredito até que por hoje esses que me viram num momento anterior à esse, admiram o fato de eu ter aberto outra porta e mais do que isso, estar trilhando um novo caminho, mas acho, sem dúvida que o valor das experiências e esse sentimento mágico que só os brasileiros conhecem em profundidade, que é a saudade, dignificam o momento presente e permitem que num momento futuro, este momento que agora se vive e que logo será passado, ganhe um valor imensurável do que se viveu, das coisas e das pessoas, enfim, de tudo.
Sem medo, se ainda não abriu uma porta nova na sua vida, eu te convido a fazer isso amanhã.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Eis o pior e o melhor de mim, o meu termômetro, o meu quilate.

Pior porque doeu, coloquei tudo a perder, me prendi, me soltei, me segurei, me deixei levar pelo que senti.

Melhor porque me descobri, me fiz mais forte, resisti, me aceitei, vi o mundo com outros olhos, entendi o valor de coisas que eu condenava, vi pessoas que merecem respeito e que antes eu não saberia respeitar, vi que ser feliz não é uma regra e nem tem um jeito só de se-lo, descobri que posso ser maior do que eu mesmo e não caber em mim de vez em quando.
Que furar o bloqueio não mata se soubermos segurar a onda, que aprendi a esperar na adversidade e a ter esperança no desespero, dormir na dor, acordar com o mesmo amor de sempre e lutar com a mesma garra que tive, mesmo quando eu não me conhecia e lutava por causas que não eram minhas, sofria por dores que não doiam em mim.
Hoje eu descobri quem sou eu, vivo em mim, definitivamente.
Me sinto mais dono de mim depois disso.
Não preciso acreditar no que decidiram que eu sou, de fora pra dentro, a imagem do espelho não reflete quem eu sou. O que vale é o que eu sinto, porque é isso que me move e que me faz ser e pensar como sou e penso.

Vem, cara, me repara
Não vê, tá na cara, sou porta bandeira de mim




Preciosidades.

A única coisa que me dói é não ter, nem ver coisas concretas, me diga "agora não", "depois", "mais pra frente" mas não me seja tão reticente. A sensação de estar num banho maria é dolorida, eu não nasci pra estar na estante, nem no altar, até por isso não sou santo. Mas mortal, carnal.
Eu vou cuidar, vou entender, vou esperar, vou tudo o que você quiser, mas me prometa, me jure, me assine dizendo que não vai me deixar. Agora procuro coisas plenas, amor concentrado, não diluído, em doses altas, puro, essencial.
Ou é ou não é. Eu só quero um amor de verdade e os de verdade não são roubados, nem comprados nem nada, são porque são e acabou. Preciso de uma utopia amorosa pra viver em paz, de uma ilusão doce que me proteja, que me envolva, que me ocupe, que me dê novas razões.
Me perco todinho nesse monte de necessidades vitais que eu tenho e que se empilham esperando a ordem de embarque que o tempo determina. Tenho um punhado de besteiras e bobagens, ilusões, desenganos, algumas mentiras e esperanças vencidas, azedas pra jogar fora. Mas a questão: como?
Acho que descobri um novo tipo de lixo: o lixo sentimental, do qual tenho toneladas.  Por favor, uma Política Universal dos Resíduos Amorosos.
Ainda que imune de pretensões, dava pra notar o contato discreto com todas as pré-tensões dessa nova realidade que me fascina e assusta, isso porque às vezes ninguém vai medir, se ficar ou partir, vai fazer-me sentir alguma diferença. E por que? Porque a vida alí era morna: não queimava os momentos bons e não congelava as passagens ruins.
Até por tudo isso, o não sentimento de falta não pressupõe a presença, admite que na ausência de alguém para sentir falta, há ausência de tal sentimento também.
Haviam particularidades que você expunha sem medo de nada e que minha hipocrisia adorava guardar em silêncio sob o manto da falsa moralidade. Comigo, sempre foi normal eleger paixões, escolher por quem suspirar, como num sorteio onde tudo depende do que vier à nossas mãos, anonimato não doia.
Mas ocorre, que só nas coisas que escrevo "você" abre mão de ser pronome de tratamento para ser pronome indefinido, a gramática sabe que espero por alguém. Gravado nos olhos, mas afastado do coração, você foi o pecado que um dia eu quis pra mim. Eu desejava ser você ou um dos seus, o importante era estar na sua vida de alguma forma, eu só sabia olhar como quem olha da janela extremamente limpa e bem vedada, do alto de um prédio, essa tua vida que alucina e faz suspirar.
Mas sabe, não gosto de tabus que não possam ser quebrados, de obstáculos que não possam ser ultrapassados, de silêncios que não possam ser rompidos, viva a sociedade anônima dos que guardam a felicidade dentro de um recipiente chamado MEDO!
Porque mesmo apesar de tudo isso, me era ainda possível listar, ainda que sem nomes, quantos foram os últimos amores dos meus olhos, pois só eles se apaixonavam, o resto do meu corpo só sofria.
    

domingo, 27 de março de 2011

Não ter porque.

Deixa eu cuidar de você e te fazer sentir-se bem ou ainda em menor estado de embriaguez possível.
Para além disso me permita embriagar-te do que não sei se tem visto nos últimos anos e que sabemos que não verás, nessa mesma embriaguez de que falo, pelos próximos anos.
É de trato, cuidado e carinho que quero embeber teu coração, é de mãos macias que quero envolver o teu rosto, é de calor que quero abraçar o teu corpo.
Saia, ou me deixe tirar-te, dessa sua loucura pobre, desse momento de conformação etílica, desse sentir-se nada, da auto-crítica não sóbria, dessa fugacidade.
Apenas me dê as mãos e um beijo com gosto de chance.